19.11.15

Resenha #39 - Persépolis

Olá, aqui é o Thierry e estarei falando sobre Persépolis, que é uma história em quadrinhos escrita e desenhada por Marjane Satrapi com o intuito de mostrar para os seus amigos ocidentais como foi a sua vida no Irã e os quatro anos de sua juventude passada na Áustria. O título da obra vem de uma cidade histórica localizada no atual Irã e significa "Cidade dos Persas" e diz muito sobre o contexto histórico que é extremamente necessário saber para uma melhor compreensão da obra.

O volume único começa com uma introdução para nos situarmos na história do Irã, região que fazia parte do Império Persa e acabou sofrendo com diversas dominações, sendo a invasão árabe em 642 uma das mais marcantes, com os árabes impondo seus costumes,  como a religião islâmica, aos persas. Mas essa subordinação começou antes, como é mostrada durante a HQ. O Povo persa viveu mais 2500 anos de submissão e tirania (iniciada pelos próprios imperadores persas durante o Império Sassânida, último império persa pré-islâmico) e isso moldou a história e a cultura iraniana, que, por ser uma mistura de vários povos, torna-se algo singular e instável. Ainda no contexto histórico, devemos lembrar que após a Segunda Guerra Mundial, o Oriente Médio foi um território muito disputado devido às grandes reservas de petróleo. O Irã tornou um estado fantoche - o Xá (título dos monarcas iranianos) Mohammad Reza Pahlavi foi posto de volta no poder do Irã pelos ingleses, que em troca ganhavam petróleo e grande influência no território- e a população se revoltou contra esse governo opressor em 1979, na conhecida Revolução Iraniana, que derrubou o Xá e instalou uma República Islâmica, o que não acabou com a tirania do governo e a submissão do povo. E é nessa transição que Marjane começa a contar a sua história.


Satrapi cresceu em uma família politizada, moderna e apenas um pouco religiosa. Ela foi educada em uma escola francesa e laica até os 10 anos, quando se viu obrigada a usar o véu pela primeira vez, pois o governo de cunho religioso fechou às escolas bilíngues por ser um sinal de decadência ocidental e criou novas escolas separando as crianças por sexo. Desde cedo Marjane mostra-se disposta a aprender e que tem uma veia revolucionária, inclusive nas suas leituras influenciadas pela família e amigos. Que varia das ideias socialistas de Marx, do anarquismo de Bakunin, do feminismo de Beaviour, da psicanálise de Freud, entre outros pensadores que são citados durante o livro.

Os personagens secundários são muito bem trabalhados e moldam a vida de Sartrapi. Como a empregada que ela tinha quando criança, Marjane se perguntava o porquê dela não poder comer na mesa junto à sua família; a sua avó que é vista como um porto seguro e conselheira; o seu rebelde tio que é visto como um herói após sobreviver várias torturas durante o Império e morrer como preso político durante a república islâmica; os seus pais protetores, sempre a postos contra o governo tirano e dispostos a fazer o que for preciso para um bom futuro para a filha; e os amores conturbados que a ajudou a se firmar após momentos tristes.

A primeira viagem de Marjane para a Áustria, deixa bem claro a diferença sociocultural entre o ocidente e o oriente. Na Áustria ela era vista como uma pobre islâmica e no Irã como uma perversa com visões ocidentais. Depois de quatro anos em Viena, ela voltou para o Irã em depressão, inclusive tentando se matar, mas ao não conseguir, percebeu que precisava mudar de vida. Se formou em Artes no Irã e se mudou para a França, onde vive até hoje.


Outros assuntos delicados são tratados durante a HQ, como o extremismo religioso, mostrando que não é algo exclusivo do islamismo, sendo ela insultada gratuitamente diversas vezes por freiras. O alistamento de crianças no exército, para as quais eram dadas uma chave para o paraíso com direito a comida à vontade, mulheres, casa de ouro e diamante. O desprezo com os imigrantes iranianos na Europa, sendo tratados como nada e tendo que começar do zero, até mesmo os que tinham de tudo no país natal.

Na parte técnica, Marjane usa uma arte simples, com poucos detalhes e focando mais nas expressões das personagens. A narrativa é bem didática, não deixando passar nenhum detalhe sobre os costumes, o que se passava no Irã e dos vários problemas durante sua vida. Para auxiliar a narrativa, o volume é dividido em vários capítulos divididos por temas em ordem cronológica, que ajuda a filtrar os assuntos, não falando de muitos de uma vez só.


Persépolis é uma HQ marcante por apresentar uma forte mulher como protagonista, que luta pelos seus direitos como mulher em uma sociedade extremamente machista e por mostrar como sua foi sua vida num Irã com guerras constantes e extremismo religioso e como foi difícil ser aceita como iraniana numa sociedade ocidental. Marjane também é responsável por desconstruir estereótipos do Oriente Médio. Mostrando que existem vários povos na região e que nem todos que seguem a religião islâmica são extremistas. Ela consegue nos deixar próximo do Irã, diminuindo a enorme distância que parece ter entre o Ocidente e o Oriente Médio. Apenas parece.

Editora: Companhia das Letras
ISBN: 978-85-359-1162-6
Gênero: Autobiografia
Páginas: 352
Minha avaliação: ★★★★★


10 comentários:

  1. Não conhecia e nem a autora, gostei muito.
    Sua resenha está bem completa, despertou minha atenção e interesse pela leitura, parabéns.

    www.detudopouco.com.br

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  2. Nossa, fiquei chocada por ela até tentar se matar por não conseguir se sentir parte de um lugar...deve doer isso de no Irã ser vista como como uma perversa com ideias ocidentais e na Áustria como uma pobre islâmica. Que bom que ela conseguiu superar a depressão e encontrar um novo lugar para viver. E sim, o extremismo religioso não é exclusivo de nenhuma religião, tem gente fanática em todos os lugares. Não curto muito história e me pareceu que o contexto histórico é bem presente na HQ, então acho que não leria, apesar de ter gostado do traço.

    Beijo!

    Ju
    Entre Palcos e Livros

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  3. Oie!
    Confesso que vi essa capa, mas nunca parei para ler sobre o que se tratava a história. Minha desatenção foi tanta, que para mim, era uma história se fantasia. Sei, cometi essa enorme falha e deveria saber mais sobre a HQ.
    Gostei da sua resenha, e também do assunto relatado na HQ. Principalmente de todo conceito histórico, onde muitas vezes, desconhecemos tudo o que aconteceu.
    Bjks!
    http://www.historias-semfim.com/

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  4. Oiee.
    Deve ser uma depressão bem grande para a pessoa tentar algo assim, mas que bom que ela superou tudo né. Não conhecia a trama, mas acabei por ficar um pouco curiosa em ler e saber mais sobre o que a personagem vivencia

    Beijos da Fê
    As Catarina´s

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  5. Oiee ^^
    Ainda não conhecia essa HQ, mas já coloquei na listinha de desejados. Esse é um assunto que me interessa muito, principalmente por tudo o que anda acontecendo no Oriente ultimamente. Conhecer uma protagonista feminina forte também seria muito bom ♥
    MilkMilks
    http://shakedepalavras.blogspot.com.br

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  6. Oiiie,

    Não conhecia nem a autora e nem a obra. Não sou chegada em quadrinhos, quase nunca sei a sequência que seguir (não sorri). Mas adorei a sua resenha. E a capa e interior do livro também é muito lindo.

    Beijos

    ♡ Amantes da Leitura



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  7. Olá, desde que eu vi essa HQ pela primeira vez é minha meta de compra e de leitura, mas acaba não sobrando para adquirir ela, eu amei a sua resenha e fiquei com mais vontade ainda de ter o livro em mãos! Ano que vem sem falta irei atrás dele! hahaha

    Beijos

    http://www.oteoremadaleitura.com/

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  8. Olá,

    Já vi muitos comentários sobre a HQ. Mas não tenho o hábito de ler hq ou quadrinhos, sua resenha está completa, porém nem isso me chamou a atenção, dessa vez deixarei a dica passar.

    Beijos,
    entreoculoselivros.blogspot.com

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  9. Acho que, considerando o momento histórico atual, o tema abordado é muito pertinente. É sempre bom poder discutir questões como extremismo religioso, discriminação à mulher e crianças alistadas no exército. Também acho importante trazer a público a noção de que os imigrantes iranianos sofrem preconceito e rejeição na Europa e, claro, não dá para deixar de mencionar a importância de se desconstruir a visão, por vezes distorcida, que os ocidentais têm do Oriente Médio. Mesmo reconhecendo a relevância de tais discussões, a obra não me cativou. De qualquer forma, foi bom conhecê-la para poder indicar para quem curte o gênero. ótima resenha!

    http://leituras-compartilhadas.blogspot.com.br/

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  10. Olá, como sou antiquada, nunca li um HQ assim, só dos super hérois (deleta essa parte!!!
    Mas, gente que riqueza! Parece ser tão precioso toda história, com detalhes de cultura e história e informações.
    A Capa tão linda, gente preciso desse HQ!
    Que resenha perfeita retratou com perfeição o drama da personagem e suas dificuldades culturais e preconceito, e tão atual.
    Olha parabéns pela resenha, vou tirar esse véu de preconceito e dar chances a HQ e Magás, pois to me surpreendendo com as resenhas que tenho visto.

    Beijos.

    Giuliana

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